Artigo - Aquisição de terras envolvendo capital estrangeiro ainda gera polêmica e insegurança jurídica


 

Parece não ter fim a discussão jurídica acerca da aquisição de imóveis rurais no Brasil envolvendo pessoa jurídica nacional com participação de capital estrangeiro. Afinal, essas empresas, uma vez constituídas e sediadas no país, ainda que tenham capital estrangeiro, não podem ser consideradas brasileiras? E se assim for, não têm o direito a adquirir e registrar os imóveis que comprar?

 

A Lei 5.709, de 1971, regula a aquisição de imóvel rural por estrangeiro residente no país ou pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil. Prevê que cada município brasileiro não pode ter mais de 20% de suas terras registradas como propriedade de um estrangeiro ou de empresa de capital estrangeiro e proíbe a aquisição de terras localizadas em faixa de fronteira - uma questão indiscutível pois envolve segurança nacional.

 

A polêmica refere-se à limitação de aquisição de propriedades rurais por pessoa jurídica nacional com capital estrangeiro. No Estado de São Paulo, desde 2012, um parecer da Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo liberava tabeliães e oficiais de registro a validar estas aquisições. Agora, uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu os efeitos do parecer – fruto de ação ajuizada pelo Incra e a União contra o Estado de São Paulo.

 

Apesar da suspensão, o Ministro Marco Aurélio, relator do processo, considerou a questão “controvertida no âmbito administrativo”. E determinou que seja anexado ao processo uma alegação da Sociedade Rural Brasileira que defende a liberação da venda de terras agrícolas em todo o País. Os dois processos terão o mérito julgado de forma conjunta. Integrantes do atual governo - entre eles o ministro da Agricultura, Blairo Maggi - já se manifestaram publicamente como favoráveis a discutir esta questão.

 

Para a Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo, é impossível haver distinção entre empresas nacionais, sejam elas compostas ou não por capital estrangeiro. Esta é uma opinião da qual compartilho, uma vez que uma empresa brasileira de capital estrangeiro é, em sua essência, uma empresa brasileira – uma vez que possui sede e administração no País, tem sua constituição sob as leis brasileiras e opera diante delas, ainda que a maioria do capital social dela se concentre sob o poder de estrangeiros, pessoas físicas ou jurídicas com residência e sede no exterior, respectivamente.

 

Estas empresas têm o direito à livre iniciativa, podendo tornar-se mais competitivas a partir de investimentos em solo brasileiro – literalmente. A circunstância do controle da pessoa jurídica brasileira ser exercido por estrangeiros não é, à luz da Constituição de 1988, fator discriminatório legítimo entre pessoas jurídicas brasileiras: não o é, realce-se, para impor restrições, limitações à apropriação privada, mas, em certas situações, poderá sê-lo para definir benefícios, incentivos, o que é diverso.

 

A falta de clareza e a divergência de interpretações com relação à legislação têm gerado pareceres contraditórios e conflitantes num momento em que investimentos estrangeiros são mais que bem-vindos. São empresas que, por não conseguirem registrar suas terras e terem suas atividades limitadas, levam seus recursos para outros países.

 

O agronegócio padece com a crise e a escassez de crédito. E o Brasil, com suas amarras jurídicas, afasta aqueles que poderiam fomentar este setor tão importante especialmente em regiões mais carentes de investimento, como o Norte e o Centro-Oeste. Que esta discussão – extremamente urgente e importante - deixe de lado ideologias e pressões políticas e considere apenas o essencial para a retomada do crescimento brasileiro no setor agrícola.